Representações Sociais de Violência em Escolas Públicas Brasileiras.
Sergio Kodato[1], Adriana C. F. Caldana[2], Denise Kotchetkoff [3], Vivian Naiara Takahashi [4]
Resumo
Esse estudo procurou investigar representações sociais de violência, como processos simbólicos que determinam práticas de instigação ou de controle da agressividade, em escolas públicas. Referenciando-se no método de análise das representações sociais, Moscovici, Jodelet, Farr, Spink, Guareschi, Arruda, procurou-se a análise das práticas discursivas dos sujeitos envolvidos na tarefa pedagógica. Enquanto procedimento, realizou-se a observação aprticipante da instituição e foram aplicados questionários relativos ao tema violência e condições de ensino, em uma amostra de 20% dos professores e 5% de alunos. Como resultado pode-se afirmar que encontra-se em curso no imaginário escolar, um processo de criminalização de episódios de indisciplina, ocorrendo freqüentes associações entre conduta reativa infanto-juvenil e delinqüência, como ameaça de agressão violenta à integridade física ou moral. A impotência no desempenho do papel de ensinar e educar amplia a percepção de risco de agressão, dificultando a comunicação e disseminando a percepção do espaço público escolar como campo de embates diretos e simbólicos. A representação da violência como fenômeno exterior à dinâmica escolar, desobriga o professor de seu papel preventivo e mediador. O individualismo impede a percepção coletiva da função social e a representação da catástrofe como possibilidade de sua superação. ( FAPESP)
Palavra chave: Representações sociais, violência, escolas públicas, indisciplina e criminalização.
SOCIAL REPRESENTATIONS OF VIOLENCE IN BRAZILIAN PUBLIC SCHOOLS
ABSTRACT
This research aimed to investigate social representations of violence, defined as the symbolic processes determining conducts of instigation or aggression control in Brazilian public schools, in a countryside city with a 500,000 hbs. population. Investigation employed the social representation analysis method, proposed by Moscovici and Jodelet, which is based on the investigation of discourse practices produced during pedagogical relationships. Initially, we performed ethnographical observation in classrooms and school environment, followed by individual interviews and a questionnaire on violence and teaching conditions on a 20% sample of school staff and 5% of students. Data analysis employed idea association method, as described by Mary Spink. As a function of increasing urban violence in the county (homicide tax, 46.2 per 100,000 hbs/year), of the lack of mechanisms of discipline control and pedagogical activity, and of the increasing verbal aggression and unrespectful behavior to authority figures, compiled social representations indicate a crimininalization process of indiscipline episodes occurring in the scholar imaginary, converging on a frequent association between the ordinary juvenile revolt and the delinquent and criminal conduct. The perception of risk of aggression, in teachers, is exacerbated by the level of impotency in their institutional role, creating difficulties in communication and disseminating the perception of the public school as a direct and symbolic battle-field. The fear, the individualism, and the lack of an effective pedagogical project prevent the construction of a collective representation of the social role of school, as practices and social relationships directed to knowledge and widespread well-fare. (FAPESP)
Keywords: Social representations, violence, public schools, indiscipline, criminalization.
INTRODUÇÃO
O fenômeno da violência nas escolas públicas enquanto representação de uma certa desordem social e institucional indica ser resultante da parcialidade do funcionamento das organizações e serviços públicos, configurando-se como um fenômeno paradoxal, decorrente de fatores sócio-econômicos gerais e, das condições de funcionamento e gestão do equipamento educacional singular. Por que determinadas escolas localizadas nos mesmos bairros periféricos, dominados pelo tráfico de drogas e crime organizado, não apresentam episódios graves de violência, enquanto que em outras, predomina o clima de guerra, conflito e explosões? A violência escolar não é só preocupante, ela parece ser um indicador terrível de decadência civilizatória como tragédia do desenvolvimento e catástrofe humanitária.
Segundo Sposito (2001:100), “... a própria escola, enquanto campo de conflitividade que configura a interação entre jovens e instituições do mundo adulto deve ser investigada e submetida à crítica.”Ou seja a violência é um fenômeno social, mas cada escola representa e maneja esse fenômeno de uma forma própria, singular, implicando métodos de resolução de conflitos. A preocupação com o fenômeno decorre do fato de que, houve um aumento geral da criminalidade no município e nas ocorrências de violência nas escolas, nos cinco últimos anos, repercutindo consideravelmente no processo de ensino e aprendizagem.
Violência, etimologicamente, “do latim violentia, exercer violência sobre, forçar, coagir”. (Cunha, 1997). Para Girard (1991), a violência é algo inexorável, inerente a interação humana e em não podendo ser evitada, precisa ser canalizada, desviada para outros fins e objetos. É com esse sentido, que pode se interpretar a história da humanidade, como o percurso dos ritos sacrificiais, e suas vítimas expiatórias. O apaziguamento da comunidade, sempre foi buscado através da descarga, como catarse da “violência de todos contra todos”, para o ritual da “violência de todos contra um”. É recorrente na história dos grupos humanos a eleição ou constituição de “bodes expiatórios” que representariam essa tentativa catártica e domesticatória.
Os ritos expiatórios evoluíram para as práticas religiosas, que mesmo sem sacrifícios, sejam de humanos ou de animais, preservam o caráter sacrificial, através da reverência “àquele que morreu para nosso bem”. Das práticas religiosas, o movimento social em busca de mecanismos mediadores constitui as instituições, enquanto instâncias mediadoras dos conflitos sociais. A justiça enquanto representação da vingança institucionalizada traria em seu cerne o equilíbrio e o fim do clamor das vítimas não vingadas. A polícia enquanto emblema da segurança e da agressão legalizada representa o poder e violência da maioria sobre a minoria desviante. Quando as instituições em crise, não suportam e nem permitem alicerce às representações coletivas, que ocupam o espaço público para o bem comum, abre-se campo para as re-ações minoritárias, para o empobrecimento do capital social, do individualismo, levando a perda de sentido existencial e a impotência, implicando violência como prazer, poder e espetáculo.
A degradação do processo civilizatório, a crise de acumulação na periferia do capital monopolista, a reprodução e legitimação da miséria pelo estado, tudo isso implica corrosão e decadência das instituições, e a profanação dos rituais civilizatórios e sagrados. Na perspectiva da canalização da violência para fins socialmente úteis, Freud (1976) mostra o caminho do processo sublimatório para os impulsos destrutivos e a conseqüente necessidade de aperfeiçoamento da cultura. Para Arendt (1973:34), violência tem a ver diretamente com poder, ou melhor, não poder. “Só quando vêem sua capacidade de poder declinando, o controle sobre o outro escapando às mãos é que os indivíduos recorrem à violência”. Nesse sentido, a violência resultaria diretamente da impotência diante da opressão social, da miséria material e espiritual e seria, portanto uma forma de produzir sentidos para uma existência vazia e alienada.
De acordo com Mattaini (1997) em muitos grupos humanos, a violência tem caráter instrumental sustentando-se numa cultura da “coerção recíproca”, que impele os indivíduos a reagirem violentamente diante de situações conflitivas e ameaçadoras. Todo ato violento é sustentado na opinião, na representação que se tem do fenômeno. Jodelet (1985:74) coloca as representações sociais como “modalidades de pensamento prático orientadas para a comunicação, compreensão e interpretação do mundo social, material e ideal”. Para Durand (1988:11), “quando por qualquer razão, o objeto não pode apresentar-se à sensibilidade em carne e osso, nesse caso de consciência indireta, o objeto ausente é re(a)presentado à consciência por uma imagem no sentido amplo do termo”.
De acordo com Jovchelovitch (1998:77), “representações são construções sempre ligadas a um lugar a partir do qual sujeitos representam, estando, portanto, intimamente determinadas por identidades, interesses e lugares sociais. Nessa medida, elas representam uma forma particular de construção do objeto e estão, constantemente, em relação com outras representações que representam outros sujeitos e outros lugares sociais”.
Madeira (1999), chama a atenção para o fato de que o desdobramento mais nocivo do que denomina a síndrome da violência é “sua ação direta e perversa sobre a atividade pedagógica nas escolas públicas para adolescentes dos setores populares. A violência nas escolas públicas do município de Ribeirão Preto multiplica-se rapidamente. De acordo com Brancaleoni (1999), a cada ano, as ocorrências registradas pela ronda escolar, nas escolas do município, aumentam e, além disso, uma série de ocorrências que poderiam ser tipificadas como crime (atentados ao patrimônio, explosão de bombas, porte de tóxicos, agressão contundente, etc), não são comunicadas a ronda escolar.
No município, o quadro geral é de criminalidade ascendente. O índice de homicídios em Ribeirão Preto (SP), para cada 100.000 habitantes, segundo os dados do SEADE (2000), apresenta uma elevação crescente nos últimos anos, saltando de 15,89 em 1991, para 46,40 em 2000. De acordo com Silva (1998), nos últimos dez anos (1987-97) no município, não só houve um aumento no número de delitos cometidos por adolescentes, como ocorreu um agravamento das infrações cometidas. O homicídio doloso foi a infração mais praticada, aumentando quarenta vezes, seguido do tráfico de drogas e porte de armas. Do total de homicídios cometidos na cidade, 50% o são por adolescentes.
O agravamento da violência juvenil e o recrutamento de alunos pobres pelo tráfico organizado introduziu paulatinamente na dinâmica escolar, a venda, o consumo de varejo, as brigas e disputas entre grupos rivais. Por outro lado, houve um lento desmonte, dos organizadores político-pedagógicos que sustentavam o fazer cotidiano na escola pública. O aumento do número de alunos sem investimentos em infra-estrutura, a relativização dos instrumentos de avaliação e controle de freqüência, os salários precários e o baixo nível de motivação do professor redundaram em um ensino desmotivante e “distante da realidade do aluno” que implicou um agravamento da indisciplina e uma escalada da violência.
De acordo com Brancaleoni (1999), na medida em que as ocorrências nas escolas tipificadas pelo código penal constituem-se em 1,7% do total de penalidades cometidas no município, poderia estar ocorrendo um processo de agravamento de eventos de indisciplina no imaginário escolar, atribuindo-se um sentido delinqüencial a condutas reativas a inadequação e insatisfação metodológica e relacional. Essa é a questão que orientou a investigação para o campo das representações sociais e seu universo simbólico. De acordo com Aquino (1996:156) “na escola parece haver uma geopolítica imaginária imbuindo e esquadrinhando a ocupação dos lugares instituídos. Disso resulta um ininterrupto campo de lutas, sujeito a perdas e danos...”
METODOLOGIA
A pesquisa buscou suporte num método qualitativo, referenciado na etnografia, que implica incursão em profundidade no próprio grupo e campo da investigação. Procurou-se entender as representações de violência na instituição escolar, a partir da observação participante nos dispositivos técnico-pedagógicos e aplicação de questionários de opiniões e percepções sobre a temática da violência e condições de ensino.
Spink (1993:102) recomenda “o uso de múltiplos métodos e de comparação intermétodo, que suscita interessantes reflexões sobre a polimorfia intrínseca das representações sociais”. No caso da presente investigação procurou se articular a observação participante do contexto institucional e o questionário como forma de acesso aos repertórios interpretativos. A investigação transcorreu no interior de uma ordem de fenômenos considerados pertinentes à análise das representações e a investigação dos processos institucionais relacionados direta ou indiretamente ao fenômeno da violência.
O acesso às representações foi buscado através da análise de discurso. De acordo com Guirado (1996:49), “o trabalho de análise é uma desconstrução da fala dos sujeitos que acaba por reorganizar-se em outra fala, o que se desmonta para reorganizar são representações”.
A análise parte do princípio de que o sujeito nos fala da perspectiva de um determinado lugar numa estrutura de relações simbólicas. Nesse sentido, busca-se uma compreensão articulada das representações sociais nos processos de subjetivação grupais e institucionais, através de suas praticas discursivas, no próprio campo da investigação. Segundo Spink (1993:91), “procura-se explicitar as determinações sociais das representações decorrentes da posição ocupada pelos diferentes atores sociais, ou explicitar os modelos coletivos disponíveis para que o indivíduo possa dar sentido a experiência social”.
A opção pela pesquisa qualitativa e a complexidade do fenômeno exige certa perseverança e diversidade metodológica desde que se observem as condições de produção e o material espontâneo que emerge na dinâmica de interações. Para Spink (1998:93), “o estudo das representações sociais em situações complexas aproxima-se das etnografias ou da pesquisa participante em antropologia”.
A investigação foi realizada em escola municipal de ensino fundamental e médio, escolhida em comum acordo com a Secretaria Municipal da Educação, tendo como critérios o grau de abertura para o estudo, possibilidade de acesso aos dados e sujeitos, disponibilidade para realização de grupos de discussão e trabalho com professores, alunos e pais. A escola conta ainda com uma coordenação atuante, empenhada em desenvolver ações de saúde, cidadania e cultura.
A pesquisa envolveu duas fases e instrumentos distintos para cada etapa da coleta de dados:
1- Análise da dinâmica institucional, de modo a se apreender as formas de contato estabelecidas entre professores, funcionários e direção e o domínio do contexto no qual se processou a pesquisa. Observação participante de reuniões com professores, visando conhecimento dos relatos de episódios de violência, bem como opiniões e interpretações da agressividade direta e simbólica em sala de aula e na escola, demandas por maior controle da indisciplina, avaliação das condições de ensino aprendizagem.
2- Aplicação de questionários semi-abertos em 20% dos professores e 5% de alunos, escolhidos aleatoriamente. O objetivo da aplicação desses questionários foi investigar as permanências acerca das interpretações de violência que circulam no imaginário da instituição e como se percebe o ensino que se pratica nessa escola. As perguntas dos questionários foram elaboradas em torno da relação do sujeito com a instituição, com os episódios de violência e sua percepção dos processos de ensino e aprendizagem.
RESULTADOS
A escola fundada no ano de 1944, carrega uma história de tradição no município, por atender muitos alunos (2732), oferecer do ensino fundamental ao médio, e por ser localizada na região central, suas aulas são muito escolhidas pelos professores, congregando uma maioria de docentes experientes e maduros. Era uma escola pública de qualidade, em que muitos alunos rivalizavam com os de escola particular na concorrência ao vestibular. Hoje, a escola sofre as consequências da queda na qualidade de ensino, sendo que a denominação de “corredor da morte”, para um dos pavilhões mais abafados e barulhentos, indica a escola como algo grandioso e lúgubre, um prédio “feio, abafado e monstruoso” e uma prática pedagógica que já não é mais a mesma. O nível de ruído em sala de aula é ensurdecedor. A escola é grande do ponto de vista arquitetônico, mas com construções improvisadas e mal acabadas.
A direção não é escolhida pela comunidade escolar, ela é nomeada pela secretaria de educação do município, através de indicações de vereadores, carecendo portanto de legitimidade, representatividade e um projeto de gestão da escola. Há uma constante instabilidade no papel e função de direção de escola, porque enquanto cargo de confiança, ele se presta a moeda de troca entre o executivo e o legislativo. O diretor não cumpre a função de liderar a execução de um projeto pedagógico, muito ao contrário fica restrito as tarefas administrativas e disciplinares.
Por outro lado, os assistentes administrativos, em número de 2 (dois), são insuficientes para todo o trabalho de coordenação administrativa, acabando por sobrecarregar o diretor com tarefas burocráticas. O Conselho de escola se parece muito mais com um comitê assessor e consultivo do diretor, do que deliberativo e gestor de políticas. Os coordenadores pedagógicos, em número de 3 (três), 1 (um) para cada período, atenderiam ou coordenariam uma média de 900 alunos e 30 professores, acumulando o trabalho de suporte pedagógico ao professor e o de atendimento a ocorrências de indisciplina e problemas de comportamento em sala de aula, que exigem intervenção superior. Com a necessidade dos coordenadores pedagógicos exercerem a função de orientadores educacionais, a supervisão pedagógica fica prejudicada.
A análise do livro de ocorrências e da dinâmica institucional indicou um alto número de encaminhamentos de alunos para a diretoria e coordenação, em função de episódios disciplinares. De acordo com o levantamento de dados, realizado pela coordenação pedagógica, os encaminhamentos no primeiro bimestre de 2002, só no período da manhã, totalizavam 117 por mês, numa média de 6 casos/dia, e referiam-se a pequenos episódios de indisciplina, geralmente conflitos entre pares e desrespeito, ridicularização ou insulto à figura do professor e, até mesmo, episódios envolvendo a sala como um todo, briga coletiva.
A freqüência de encaminhamentos localiza-se com mais evidência em alguns professores, com determinadas salas, havendo uma nítida distinção entre aqueles que encaminham sistematicamente e aqueles que nunca encaminham. De acordo com a coordenadora pedagógica após a realização de oficinas de expressão e criatividade com os professores e durante o mês de realização da gincana referente a “copa do mundo de futebol”, o número de encaminhamentos de casos disciplinares caiu em 50%, 3 (três) ao dia. Isso parece indicar a profícua relação entre a realização de atividades culturais e esportivas e a diminuição de episódios de indisciplina.
A observação da dinâmica institucional e da sala de aula, mostrou que o trabalho pedagógico do professor é solitário, no máximo se permitindo a socialização das dificuldades e sugestões de procedimentos com alguns pares. As coordenações oferecem pouco suporte necessário ao exercício cotidiano da autoridade pedagógica e conseqüentemente o professor vai se alienando de sua função social e se desobrigando do manejo de sala de aula, enquanto enquadre necessário ao processo de transmissão e assimilação de conhecimentos. A cultura do descaso e do individualismo, em que não se considera o mérito e esforço do professor, cria uma situação de desmotivação e desilusão. Não contando com o apoio da hierarquia e dos setores técnicos, sendo pouco reconhecido em sua autoridade e saber, freqüentemente enfrentando competição entre pares, constituem-se nas vítimas expiatórias dos alunos e dos mais antigos, que se sentem donos de uma parcela de poder da escola.
Observou-se nos dispositivos grupais, que a distância entre professores e a direção, implica pouca comunicação e entrosamento, gerando insatisfação por parte de alguns segmentos de professores com relação à ausência de articulação do poder institucional, principalmente nas questões referentes a disciplina e dificultando um trabalho em equipe e uma representação coletiva do papel da escola. O exercício do poder por delegação, compartilhado ou subserviente à burocracia, faz com que, ocorram hiatos ou fissuras nos processos de mando, refletindo no manejo de sala de aula, já que os professores quando não respaldados pela direção em suas decisões disciplinares, abdicam de resolver questões de comportamento em sala de aula, encaminhando todos os casos para a diretoria. Isso implica um congestionamento dos coordenadores e mesmo da direção no atendimento e encaminhamento de tais casos, que envolvem desde alunos machucados com ferimentos leves, mal estar súbito, brigas entre alunos, pequenos furtos, desobediência e confronto aberto com a figura do professor. Hoje em dia em situação de confronto aberto, o professor não tem alternativa a não ser o envio do aluno à diretoria. A perda do recurso da reprovação e expulsão do aluno é lamentada por muitos professores.
A partir da observação de reuniões de docentes, pode-se perceber que a escola é movida por sentimentos paradoxais, de desânimo e descrença, de reclamação e niilismo, mas também de expectativa e empenho por mudança. É como se, em determinados momentos a descrença tomasse conta, ninguém a quem se pudesse recorrer para reclamar ou solicitar algum auxílio, em outros, o coletivo como um todo mobiliza-se com entusiasmo em torno de uma tarefa comum. A representação da escola como um espaço público tomado pelo descaso, inanição e imobilismo, não é hegemônica entre seus agentes, uma vez que nas reuniões manifesta-se o livre debate, a agitação de idéias, a proposição de questões e mudanças. Por outro lado, é interessante e louvável o esforço de determinados professores que, condoídos com o sofrimento atroz de determinados alunos, por rejeição, violência ou abandono familiar, envolvem-se obstinadamente no sentido de oferecer ajuda e suporte, muitas vezes utilizando seus próprios numerários.
Os questionários referentes à violência e condições de ensino foram aplicados em 20% do total de professores e 5% do total de alunos, visando reconhecer questões recorrentes, temas emergentes e representações de violência e ensino.
Síntese dos questionários
Professores = 26 |
|
Idade |
% |
De 30 à 35 |
20 |
De 36 à 40 |
27 |
De 41 à 45 |
7 |
De 46 à 50 |
27 |
De 51à 55 |
20 |
Sexo |
% |
Masculino |
10 |
Feminino |
90 |
Família |
% |
Marido |
13 |
Marido + Filhos |
53 |
Filhos |
7 |
Filhos + Mãe |
7 |
Pais |
13 |
Outros |
7 |
Violência |
|
Lugar onde mora |
% |
Não |
32 |
Sim - agressões, assaltos, furtos, armas, assassinatos e drogas |
68 |
Em casa % |
|
Não |
87 |
Sim |
13 |
Na escola |
% |
Brigas entre alunos |
60 |
Brigas entre alunos e professores |
20 |
Brigas entre professores |
7 |
Desrespeito e brincadeiras de mau gosto |
33 |
Destruição do prédio e do patrimônio escolar |
30 |
Furtos |
7 |
Não há |
13 |
Dificuldades |
% |
Alunos desinteressados |
27 |
Desorganização nas escolas e falta de material |
33 |
Excesso de alunos |
33 |
Falta de docentes e funcionários |
13 |
Família dos alunos desestruturada |
23 |
Indisciplina |
60 |
Processo de ensino ultrapassado |
33 |
Melhorias |
% |
Redução da quantidade de alunos por sala |
27 |
Assessoria pedagógica |
7 |
Adequação do conteúdo programático |
13 |
Conscientização e envolvimento profissional e familiar |
40 |
Controle da indisciplina |
47 |
Cursos extracurriculares e atividades esportivas |
13 |
Aumento do corpo docente e funcionários |
27 |
Melhores salários |
20 |
Suporte psicólogo p/ professores e alunos |
33 |
O que fazem p/ contribuir com as melhorias |
% |
Comprometimento com o trabalho |
47 |
Atualizar (dentro do possível) |
7 |
Escola como segmento do lar |
7 |
Relacionar Conteúdo x Mundo |
32 |
Acredita que já faz sua parte |
7 |
Sugestão pessoal para melhoria do ensino |
% |
Reprovar alunos inaptos |
73 |
Revisão do conteúdo programático |
85 |
Maior firmeza por parte da direção |
7 |
O que "Eu" poderia fazer por melhorias |
% |
Trabalhar melhor com os alunos |
27 |
Cumprir horários e evitar faltas |
7 |
Promover a interdisciplinaridade |
13 |
Cursos extracurriculares |
7 |
Ser mais ativo e cooperativo |
20 |
Integração com os professores |
13 |
Alunos = 106 | |
Idade | |
10 e 11 |
24 |
12 |
23 |
13 |
23 |
14 |
21 |
15 e 16 |
9 |
Sexo |
% |
Masculino |
47 |
Feminino |
53 |
Família |
% |
Mãe e Pai |
73 |
Mãe |
19 |
Pai |
2 |
Outros |
5 |
Não respondeu |
1 |
Violência |
|
Lugar onde mora |
% |
Não violência |
17 |
Assaltos e tiroteios |
41 |
Assassinatos |
14 |
Brigas entre vizinhos e gangues |
44 |
Roubos e furtos |
13 |
Agressões físicas (inclui estrupo) |
18 |
Agressões verbais |
11 |
Tráfico de drogas |
20 |
Em casa % |
|
Não |
47 |
Agressão física (brigas entre irmão, pai e mãe) |
32 |
Agressão verbal |
18 |
Punições |
2 |
Drogas (fumo e alcool) |
1 |
Na escola % |
|
Não |
6 |
Agressões físicas |
13 |
Agressões verbais |
41 |
Assassinato |
1 |
Atentado ao patrimônio |
4 |
Brigas entre os pares |
56 |
Condições ambientais |
8 |
Desrespeito para com os professores |
15 |
Drogas |
4 |
Prostituição |
1 |
Roubos e furtos |
16 |
Violência simbólica |
11 |
Dificuldades |
% |
Condições ambientais |
69 |
Condições físicas (trabalho, cansaço e sono) |
3 |
Dificuldade com o aprendizado |
2 |
Dificuldade com o corpo técnico e administrativo |
9 |
Falta de apoio familiar |
4 |
Falta de professores |
6 |
Interrupção de aula |
2 |
Não respondeu |
1 |
Não tem nada q atrapalha |
3 |
Segurança |
1 |
Melhorias % |
|
Acompanhamento psicologico p/ professores |
1 |
Atividades extracurriculares |
20 |
Condições ambientais |
17 |
Esportes |
1 |
Liberdade de expressão |
1 |
Melhoria do corpo técnico administrativo |
47 |
Não respondeu |
3 |
Punir indisciplina e expulsar os maus alunos |
34 |
Reforma na estrutura pedagógica |
35 |
Respeito mútuo |
8 |
Segurança |
2 |
Violência |
5 |
DISCUSSÃO
A maioria significativa do corpo docente (80%) está situada na faixa etária de 36-55 anos, indicando experiência e maturidade em potencial, bem como os problemas de acomodação e estabilização inerentes a meia idade e perspectiva de aposentadoria. De acordo com Sato (1993), a representação do trabalho como penoso, pode implicar ceticismo, estresse e aposentadoria precoce.
A maior parte é do sexo feminino (90%). Parcela significativa (66%) é casada, 14% divorciada e apenas 20% solteira. 68% da amostra de docentes considera que o lugar onde mora é violento, a maioria (87%) entende que não há violência em suas casas e boa parte da violência na escola é atribuída a briga entre alunos (60%), desrespeito do aluno (33%), atentado contra o patrimônio (30%), por parte do discente. De acordo com Cardia, efetivamente as vitimizações ocorrem nas imediações da residência, no bairro onde se mora, no raio delimitado entre a casa e a escola.
Na medida em que apenas 20% dos professores, referem-se a brigas entre professores e alunos, percebe-se uma certa tendência entre os docentes a atribuírem a fatores externos, as causas do fenômeno da violência e não se reconhecerem envolvidos ou implicados. A representação da violência na escola como algo ouriundo do externo e portanto inexorável, dificulta a ação coletiva. Sposito (2001:99) chama a atenção para o fato de que “...a ausência de um dispositivo institucional democrático no interior de algumas instituições públicas,..., é um fator a ser considerado na intensififcação das práticas violentas nos bairros e escolas.”
Por outro lado, da amostra de alunos investigada, a maior parte situa-se na faixa etária de 10-15 anos, pois a investigação limitou-se apenas a alunos de quinta a oitava série do primeiro grau, em função do fato de que o maior número de incidentes disciplinares ocorre nessa faixa, sendo portanto prioritária em termos de avaliação e intervenção. A distribuição é eqüitativa por gênero: 47%, masculino; 53%, feminino. Os discentes consideram o bairro onde vivem violento, 50% reconhece a violência em suas famílias, na forma de agressão verbal ou física. Por outro percebem-se comprometidos com a violência na escola, pois associam esse fenômeno com mais freqüência, a agressões verbais (41%) e brigas entre si (56%).
Para Guimarães (1996:79), “...tanto nas brigas como nas brincadeiras, existe uma duplicidade que, ao garantir a expressão das forças heterogêneas, assegura a coesão dos alunos, pois eles passam a partilhar de emoções que fundam o sentimento da vida coletiva.”
Os professores representam a escola como um lugar mais violento e ameaçador do que os alunos, pois enquanto esses entendem violência como roubos, homicídios, atentados graves, os professores consideram violência, brigas e xingamentos entre alunos, até “brincadeiras de mão”. Os docentes em proporção significativa (60%), consideram uma das grandes dificuldades da escola atual a indisciplina. Outros fatores também são considerados como dificuldades, desinteresse dos alunos (27%), desorganização da escola (33%), excesso de alunos em sala (33%), ensino ultrapassado (33%) e família desorganizada (23%). De acordo com Guirado (1996:57), “...pode-se pensar que há algum tipo de relação entre poder e indisciplina, que é permitida a indisciplina, ou que o poder gera a indisciplina.”
Já os alunos, majoritariamente (69%), consideram a maior dificuldade da escola, as condições ambientais, no que se refere tanto ao nível de ruído, falta de ventilação e abafamento das salas, como as aulas monótonas, inseguras e desorganizadas. De acordo com Camacho (2001:129), “os alunos adquiriram maior espaço de atuação e de decisão, mais autonomia, e se fortaleceram”. A crítica do aluno é a representação da possibilidade do instituinte no seio da escola.
Quanto as melhorias propostas pelos professores, concentram-se em controle da indisciplina (47%), consciência e envolvimento profissional deles mesmos (40%) e suporte psicológico (33%).De acordo com Guimarães (1996:79), “o grande problema talvez esteja no fato de o professor se concentrar apenas na sua posição normalizadora achando que, com isso ele conseguirá eliminar o conflito.”Ainda segundo a autora citada, “...quando o professor experimenta a ambigüidade do seu lugar, ele consegue , juntamente com os alunos, administrar a violência intrinseca ao seu papel.”
Os alunos por outro lado propõem enquanto reforma, a melhoria do corpo técnico-administrativo (47%), punir os indisciplinados, expulsar os maus alunos (45%) e a reforma na estrutura pedagógica (35%). Segundo La Taille (1996:20), “...resta à escola uma solução: lembrar e fazer lembrar em alto e bom tom, a seus alunos e a sociedade como um todo, que sua finalidade principal é a preparação para o exercício da cidadania”.
Os professores ainda acham que contribuem com o comprometimento e envolvimento pessoal (45%) e procuram relacionar o conteúdo à realidade do mundo (35%). Em sua opinião pessoal, a maioria dos docentes acha que se deve reprovar alunos inaptos (85%) e proceder a revisão do conteúdo programático (73%). Quando a questão se refere ao que o professor poderia fazer para a melhoria, a freqüência de respostas cai assustadoramente e as mais significativas referem-se a trabalhar melhor com os alunos (27%) e ser mais ativo e cooperativo (25%). Isso indica uma atitude passiva da maioria com relação ao fenômeno da violência e decadência do ensino, uma representação do imobilismo e ceticismo. De acordo com Camacho (2001:138), “...o primeiro passo em direção a uma mudança de conduta no cotidiano é a conscientização e a compreenssão dessas dificuldades da vida coletiva.” Ainda segundo a autora, “...seria importante estender a ênfase dos conceitos simplesmente pedagógicos até os (pré)conceitos que fomentam as práticas do cotidiano.”
A análise das práticas discursivas nos dispositivos grupais aponta para representações de impotência e descrença diante da violência, percebida como inexorável e externa, que, em verdade, materializa-se enquanto atos de indisciplina e rebeldia, significados como vandalismo, banditismo. Poderia estar ocorrendo no imaginário escolar, um processo de criminalização de episódios reativos, inerentes a adolescência dos alunos, e esse processo de agravamento das condutas, acaba por exigir intervenção policial, desobrigando o coletivo e especialmente o professor de sua função educativa.
As queixas recorrentes referem-se a indisciplina e a um pequeno grupo de alunos ”bagunceiros e desrespeitosos”, que conseguem desorganizar a sala de aula e a escola como um todo. Essa representação mostra que o equilíbrio de forças na escola atual é tão tênue, que uma pequena minoria pode abalar o sistema como um todo.
De acordo com Camacho (2001:129), “as tensões podem ser geradas nas relações de obediência às regras impostas ou no confronto com as diferenças culturais, sociais, econômicas e/ou geracionais.”
Considerações Finais
A observação das reuniões de professores, as respostas aos questionários e as práticas discursivas indicam que o que o professor representa como violência, não é o mesmo que o aluno. Ocorrem freqüentes associações nas práticas discursivas de professores, entre atos de indisciplina e delinqüência, indicando um processo de criminalização de episódios de rebeldia adolescente. Por outro lado, os alunos não consideram a escola violenta, na medida em que nela não há homicídios, seqüestros, assaltos, agressões graves e queixam-se da falta de autoridade da escola para lidar com os alunos indisciplinados e desorganizadores. Por outro lado, se os alunos se reconhecem como implicados nos episódios de violência, os professores atribuem o fenômeno a fatores externos a eles, como a família desorganizada, o crime e o tráfico de drogas, não estabelecendo qualquer relação entre agressividade e condições de ensino.
Para os professores a maior dificuldade da escola é a indisciplina, para os alunos as condições ambientais e pedagógicas desfavoráveis. Logicamente que para os docentes o ponto prioritário de mudança é controlar a indisciplina, enquanto que para os alunos melhorar o corpo técnico e administrativo da escola. Os docentes majoritariamente acreditam que se deve reprovar os alunos que não apresentam um desempenho mínimo e modificar substancialmente o programa pedagógico. No entanto poucos se sentem em condições de tomar iniciativas de mudança, ao contrário dos alunos que propõem a realização de atividades esportivas e culturais, e acatam com entusiasmo qualquer modificação na didática do professor, desde que seja em direção a movimento e maior sentido a aula.
Seja com relação ao diagnóstico da situação atual, seja com relação aos fatores constitutivos da violência, ou as medidas que devem ser adotadas, não há uma mútua representação e consequentemente uma vontade coletiva. A maioria pode ser articulada pelo poder, desde que esse esteja assentado na opinião do coletivo institucional. Se o poder da maioria não é representado e imposto hegemonicamente, soberanamente, ele dá margem aos pequenos poderes ou atos violentos de minorias querendo impor suas vontades a qualquer custo.
Sem o respaldo do coletivo, sem os mecanismos de controle da escola antiga, o professor se vê impotente diante da violência representada como galopante e desenfreada. A impotência implica o fenômeno descrito por Mandell, como regressão em nível psico-familiar, quando diante do fenômeno universal da incapacidade, os indivíduos do coletivo como um todo regridem e passam a se comportar como se fossem crianças e estivessem em suas próprias casas, interagindo com seus irmãos e pais. Nesse processo regressivo haveria um agravamento das representações de ameaça, como delírio institucional, “os alunos, é só o mal que eles tem na cabeça”.
Paradoxalmente o aspecto regressivo funciona articuladamente com o lado da responsabilidade social e pessoal, pois a infância pobre e sofrida do professor exige reparação e resignificação. Alguns docentes entendem que o problema é o aluno, “que atrapalha, que não respeita, que agride”, outros entendem que a questão é estrutural a escola enquanto instituição desorganizada e perversa. O reconhecimento dos problemas inerentes ao professor, conflitos entre eles só são reconhecidos pelos mais conscientes, que também demandam o domínio de técnicas de relacionamento com os alunos. Apesar dos problemas da violência nas escolas se referirem segundo os professores a problemas de super-lotação, de administração, de gestão da escola, não há organização para a ação conjunta e nem representação coletiva.
Com isso uma das problemáticas centrais da escola é a cultura do medo e do pânico disseminado que tende a agravar episódios banais criando um clima de ameaça e desconfiança. No imaginário institucional, a violência é representada como “bagunça, desrespeito, irreverência, agressividade verbal” que são associados a vandalismo desenfreado. As dificuldades no processo de transmissão de conhecimentos, a desorganização da sala de aula, a dificuldade no manejo de conflitos, realimentam a violência direta e simbólica.
De acordo com Jovchelovitch (2000), as representações sobre a esfera pública expressam-se num “cenário que aponta para a violência, medo, ameaça, desigualdades, fissuras e miséria”. Associam-se também as representações da coisa pública “a corrupção, o interesse próprio, desconfiança, dissociação entre a onipotência do poder e a impotência que a eles estão submetidos e a lei como uma fonte de ambigüidade”. A escola pública parece estar imersa nessa mesma ordem de representações de degradação e desconfiança, alimentando-se um ciclo de deterioração, pessimismo e impotência. A representação desmotivada e descrente alimenta e legitima a sensação de catástrofe, de degradação civilizatória.
Os professores encontram-se desencantados, a adoção do regime de progressão continuada flexibilizou os mecanismos de avaliação e freqüência, modificando a lógica da escola, privilegiando-se a permanência do aluno em suas dependências em detrimento de seu aproveitamento e obstruindo o poder do professor. Uma das queixas recorrentes é a super-lotação em sala de aula, que aliada a falta de mecanismos de controle, transforma a mesma num caos.
Segundo Debarbieux (2001:179), “...a incivilidade permite pensar as microviolências que, se acumulando, tornam inabitável o mundo dos homens.” “A violência escolar é uma resposta desajeitada, freqüentemente ineficaz, ao incivismo desigual do mercado escolar e urbano”.
Os processos de avaliação são parciais, os professores e a equipe técnico administrativa são pontuados superficialmente, as avaliações de alunos não são levadas às últimas conseqüências, ocasionando o fenômeno do aluno de oitava série, semi-alfabetizado. Os mecanismos institucionais de decisão coletiva, como o Conselho de Escola são acionados assistematicamente, não cumprindo seu papel na gestão comunitária do equipamento social.
O problema da violência é externo a prática pedagógica, de fora para dentro, tendo como agente reprodutor uma minoria, é o aluno que não aprende e perturba o andamento da aula. A discriminação dos fatores potencialmente aliados, como uma aula mais motivante e interessante, pouco ocorre. A neutralização da violência, através de mecanismos preventivos raramente é pensada, levando a crer que a mesma continuará a ser fator constitutivo do cotidiano escolar. As representações de violência são constituídas sem uma mediação do coletivo, o que implica fragmentação, defesas individuais e ausência de perspectiva do enfrentamento coletivo.
De acordo com Arendt (1991), “... a forma extrema de poder é todos contra um; a forma extrema de violência é um contra todos e esta última nunca é possível sem instrumentos.”As queixas de violência nas escolas apontam para uma pequena minoria desarmada ou armada incipientemente que através de seus gritos e ameaças consegue desorganizar as aulas, quando não a escola como um todo. Quando a maioria se recusa a usar seu poder para subjulgar os desordeiros; os procesos acadêmicos entram em colapso. A minoria pode ter um poder potencial muito maior do que poderia se supor...A maioria meramente observadora, distraída pelo espetáculo da discussão entre aluno e aluno, aluno e funcionário, é de fato uma aliada latente da minoria.
“Poder e violência se opõem, onde um deles domina totalmente o outro está ausente. A violência aparece onde o poder está em perigo, mas se a permitem seguir seus próprios caminhos, pode resultar no desaparecimento do poder.”( Arendt, 1973). A noção de incivilidade aponta para os dispositivos civilizatórios, possibilidade de articulação entre o pedagógico e o ético.
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[1] Docente dos cursos de graduação e pós-graduação da F.F.C.L.R.P. – U.S.P. E-mail: skodato@ffclrp.usp.br. Pesquisa subsidiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP.
[2] Doutoranda do curso de pós-graduação da FFCLRP-USP e docente das Faculdades COC.
[3] Professora de Língua Portuguesa da Rede Municipal de Ensino de Ribeirão Preto.
[4] Aluna do curso de graduação da FFCLRP-USP.